Fariseus

Definição

Rebecca Denova
por , traduzido por Pedro Lerbach
publicado em 02 fevereiro 2022
Disponível noutras línguas: Inglês, francês, espanhol
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Christ and the Pharisees, from Das Plenarium (by Hans Schäufelein, Copyright)
Cristo e os Fariseus, de Das Plenarium
Hans Schäufelein (Copyright)

Os fariseus foram uma seita judaica que emergiu em 150 a.C. e promoveu a ideia de pureza sacerdotal para todos os judeus, a crença na providência ou destino, e o conceito da ressureição dos mortos. Ainda, ensinavam que, além dos mandamentos, a Lei Oral também havia sido transmitida por Moisés. O judaísmo rabínico primitivo no segundo século da era cristã afirmou a sua descendência espiritual dos fariseus.

Origens

Após as conquistas de Alexandre, o Grande (r. 336-323 a.C.) em 330 a.C., o governo grego, além da língua, filosofia, religião e educação gregas foram adotados pelos povos conquistados na bacia do Mediterrâneo. Quando Alexandre morreu, em 323 a.C., seu império foi dividido entre seus generais durante as Guerras dos Diádocos. Um desses generais, Seleuco I Nicátor, fundou o Império Selêucida na região da Síria. Em 167 a.C., o Selêucida Antíoco IV Epifânio (r. 175-164 a.C.), tornou ilegais os costumes judaicos, o que resultou na revolta dos Macabeus, liderada pela família dos Asmoneus, quando os judeus conseguiram repelir os gregos e estabelecer seu próprio reino.

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No entanto, nem todos estavam satisfeitos com o domínio Asmoneu, que uniu o ofício de rei com o de sumo sacerdote do Templo de Jerusalém. O reinado de Israel deveria ser ocupado por um descendente da tribo de Davi, Judá. Durante este período, o sumo sacerdote deveria vir da descendência de Zadoque, o último sumo sacerdote no reinado de Salomão. Os Asmoneus não eram capazes de reivindicar nenhuma dessas linhagens.

Este é o período em que encontramos evidências do que os acadêmicos chamam de "sectarismo judaico". Vários grupos de judeus formavam seitas dentro do corpo religioso. Todos concordavam com o básico sob a Lei de Moisés e os livros dos Profetas. Uma das questões predominantes era como viver na então cultura cosmopolita dos gregos e ainda assim manter as tradições e os marcadores únicos da identidade judaica. Estre essas seitas, vemos a emergência de um grupo conhecido como fariseus. Seu nome ainda é um problema: pode significar tanto "ser separado" quanto "aqueles que suavizam coisas difíceis", em hebraico.

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Conceitos farisaicos

O livro de Levítico delineou rituais específicos de pureza e critérios para os sacerdotes que serviam no Templo. Todas as religiões antigas tinham leis sobre rituais de purificação, e muitas com rituais que continham água, mas não necessariamente relacionados à higiene. A pureza ritual era um estado do ser. Os fariseus promoviam a ideia de que todos os judeus deveriam adotar essa pureza sacerdotal, assim como os rituais do Templo, nas suas vidas cotidianas.

Os fariseus promoviam a ideia de que todos os judeus deveriam adotar essa pureza sacerdotal, assim como os rituais do Templo, nas suas vidas cotidianas.

Os fariseus eram geralmente bem literais ao organizar sua vida diária. Construíam suas casas próximas umas das outras, pois assim compartilhavam refeições e visitas no Sabbath, que restringia a distância que uma pessoa poderia andar. Construíam mikvaim (singular: mikvah), que era uma piscina natural de pedra na qual fluía água para restaurar a pureza ritual na frente de suas casas. Durante as refeições, os fariseus simbolicamente mediam o dízimo da refeição e o separavam, por pertencer a Deus.

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Por causa dessas visões, os fariseus geralmente se desentendiam com o partido dos saduceus, que dirigia as operações diárias do Templo. De acordo com escritos rabínicos posteriores, os fariseus se desentenderam com os saduceus sobre questões relacionadas aos rituais de purificação, sobre como o contágio poderia ser transferido a partir de vasos de pedra.

O Sinédrio, conselho que governava em Jerusalém, era composto por saduceus, fariseus, pelo Sumo Sacerdote, outros sacerdotes, e líderes aristocráticos que demonstravam a habilidade de agir como sábios. Um dos mais famosos desses sábios, Hilel (por volta de 110 a.C. a 10 d.C.), tornou-se a fonte para os ensinos posteriores que foram organizados nas primeiras escolas rabínicas (veja abaixo). Um de seus ensinamentos mais famosos era: "O que é odioso para você, não faça a seu irmão. Essa é toda a Torah; o resto é a explicação; vá e aprenda" (Talmude Babilônico, Shabbat 31a). Isso foi incorporado aos ensinos de Jesus de Nazaré e ficou conhecido como "A Regra de Ouro".

A Lei Oral

Os fariseus se destacavam por afirmarem que, além da Lei de Moisés (incorporada a muitos livros nas Escrituras Judaicas), Moisés também havia transmitido tradições orais que não foram escritas na época (No hebraico: Torah she-be-‘al peh, "A Torah que está na boca"). Esses ensinamentos haviam sido dados aos Anciãos que estavam no Monte Sinai e ensinaram a cada geração até seus descendentes, os fariseus. A Lei Oral incluía interpretações sobre códigos de conduta, rituais, adoração, relações interpessoais, leis sobre dieta, festivais, relações maritais e reivindicações sobre danos.

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Moses on Mount Sinai
Moisés no Monte Sinai
Jean-Léon Gérôme (Public Domain)

Uma das funções da lei oral era tanto reinterpretar a Lei Mosaica quanto atualizá-la no sentido de que, no decorrer do tempo, algumas questões e preocupações não haviam sido tratadas na legislação original. Por exemplo, era proibido trabalhar no Sabbath. No entanto, "trabalho" não era definido com detalhes. Os fariseus encontraram uma passagem que dizia que se o seu boi caísse num fosso num Sabbath, claro, você o resgataria. Por extensão, os fariseus ensinavam que a vida sempre tem precedência sobre quaisquer leis da Torah.

A Teologia dos Fariseus

Os fariseus foram uma das primeiras seitas judaicas a promover o conceito de ressurreição dos mortos.

O Deus de Israel era considerado o criador do universo e de toda a vida na Terra. Cria-se que ele era onipotente, onisciente, onipresente e infinitamente sábio. Quando os humanos foram criados, a eles foram dados dois impulsos: o de fazer o bem e o de fazer o mal. De acordo com esse sistema de crenças, havia livre-arbítrio para escolher. O estudo da Torah deveria ser interpretado pela racionalidade (dada aos humanos por Deus), considerando as condições de cada época desde a revelação dos mandamentos no Sinai. Ao mesmo tempo, porém, embora houvesse o livre-arbítrio, os fariseus também acreditavam na ideia de providência ou destino.

Ao refletir sobre os desastres da nação de Israel (a conquista Assíria no Reino do Norte em 722 a.C. e a conquista babilônia e destruição do Templo e de Jerusalém em 587/586 a.C.), os Profetas de Israel haviam predito que Deus agiria na história humana uma vez, nos últimos dias. Naquele tempo, todos os inimigos de Israel seriam destruídos em uma batalha final, seguida de um julgamento final. Todos os mortos seriam levantados e julgados, tanto para serem condenados ao Geena (forma judaica do Inferno), ou para viver uma nova utopia, o Jardim do Eden na terra, como originalmente planejado por Deus. Os fariseus foram uma das primeiras seitas judaicas a promover o conceito de ressureição dos mortos.

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A Grande Revolta Judaica de 66 d.C.

Dos anos 30 aos 60, o governo romano enviou uma série de magistrados corruptos e ineptos para a região, o que resultou numa revolta contra Roma liderada por uma seita judaica conhecida como zelotas. A revolta acabou em desastre quando o filho do imperador romano Vespasiano (r. 69-79 d.C), Tito (r. 79-81 d.C.), promoveu um cerco sobre Jerusalém e destruiu o complexo do Segundo Templo. De acordo com o historiador judeu Flávio Josefo (36-100 d.C.) e com as tradições rabínicas posteriores, um fariseu chamado Yochanan ben Zakai negociou com Vespasiano para deixar a cidade em um caixão (junto com outros). Afirmando que os fariseus só queriam paz com Roma, ele estabeleceu uma escola na cidade de Yavne, na costa. Com o Templo destruído, ele ensinou que os judeus deveriam focar nos ensinos de Moisés, enfatizando as orações acima dos sacrifícios. Outros fariseus se estabeleceram na Galileia e criaram escolas semelhantes.

Este é o início do Judaísmo Rabínico, e a partir dessas fontes, novos textos foram criados e hoje fazem parte do Talmude, ou a totalidade do pensamento judaico. Uma das primeiras ações foi escrever a Lei Oral, conhecida como Mishná. Isso foi concluído sob os auspícios do Rabino Judá, o Príncipe, em 200 d.C. Os rabinos também redigiram o Halacá, ou detalhes da lei judaica para a vida diária, e o Agadá, comentários sobre as narrativas bíblicas. Um Sinédrio foi reconstituído como corte de direito.

The Pharisees and the Sadducees Come to Tempt Jesus
Os Fariseus e Saduceus Vêm Tentar Jesus
James Tissot (Public Domain)

Um problema histórico com o estudo dos antigos fariseus é que, antes da destruição do Templo, pouquíssima literatura de sua história inicial sobreviveu. As primeiras literaturas rabínicas datam do segundo século da era cristã. Nesses escritos, os rabinos afirmam serem descendentes espirituais dos fariseus. No entanto, quando eles discutem questões e ensinos específicos, não conseguimos determinar quais deles eram relativos ao período anterior. Apenas os escritos de um fariseu desse período sobreviveram, o Apóstolo Paulo. Paulo tinha muito a dizer sobre se os gentios convertidos deveriam adotar marcadores da identidade judaica, mas através dessas cartas ele consistentemente elogiava o Templo e suas práticas.

Os Fariseus no Novo Testamento

Os fariseus são conhecidos por seu papel nos quatro evangelhos do Novo Testamento. Marcos, o primeiro evangelho (69/70 d.C.), argumentava que desde o início do ministério de Jesus os fariseus estavam determinados a matá-lo. Nos 'diálogos de conflito' (Jesus e os fariseus em debate), os fariseus fazem o papel de oposição aos ensinos de Jesus. A polêmica negativa contra os fariseus (e os saduceus) era a racionalização do porquê Deus havia permitido que o Templo fosse destruído. Marcos culpou os judeus pela morte de Jesus em vez de culpar Roma, porque os judeus de Marcos tinham que viver no Império Romano.

O problema histórico permanece, uma vez que teólogos e historiadores modernos continuam a usar a polêmica dos evangelhos para reconstruir o que os fariseus pensavam e ensinavam no primeiro século d.C. Polêmica, no entanto, não é evidência. Os fariseus são frequentemente culpados por oprimir os pobres e manter a salvação longe de seu povo, mas como uma de muitas seitas judaicas, os fariseus não tinham autoridade para impor suas ideias sobre todos os judeus.

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Bibliografia

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Sobre o tradutor

Pedro Lerbach
Pedro Lerbach é tradutor freelance. Estudou ciência política na Universidade de Brasília e fala português, inglês, espanhol e francês.

Sobre o autor

Rebecca Denova
Rebecca I. Denova, Ph.D. é Professora Emérita de Cristianismo Primitivo no Departamento de Estudos Religiosos da Universidade de Pittsburgh. Ela escreveu recentemente um livro didático, "The Origins of Christianity and the New Testament" [As Origens do Cristianismo e do Novo Testamento], publicado pela Wiley-Blackwell.

Citar este trabalho

Estilo APA

Denova, R. (2022, fevereiro 02). Fariseus [Pharisees]. (P. Lerbach, Tradutor). World History Encyclopedia. Obtido de https://www.worldhistory.org/trans/pt/1-20491/fariseus/

Estilo Chicago

Denova, Rebecca. "Fariseus." Traduzido por Pedro Lerbach. World History Encyclopedia. Última modificação fevereiro 02, 2022. https://www.worldhistory.org/trans/pt/1-20491/fariseus/.

Estilo MLA

Denova, Rebecca. "Fariseus." Traduzido por Pedro Lerbach. World History Encyclopedia. World History Encyclopedia, 02 fev 2022. Web. 03 nov 2024.